Hoje, venho aqui falar um pouco sobre algo que pouquíssimas pessoas entenderão o motivo que me levou a tirar parte do tempo de que disponho para versar sobre. Na verdade, a minha relação com os Deuses Brilhosos parte de uma experiência particular, pautada numa certa obervação acerca de determinado grupo de pessoas.
Para início de conversa, parto da pergunta óbvia que qualquer leitor pode de cara conjecturar: Quem são os Deuses Brilhosos? Essa indagação suscita outra? Não menos óbvia: Todos os Deuses não são brilhosos? E mais outra: E os Deuses que não são brilhosos são o que? Diante dessas, poderiam surgir inúmeras outras, mas para evitar circunlóquios e mais circunlóquios, procurarei ser o mais breve possível, escrevendo algo mais próximo de um telegrama e mais distante das missivas de Caminha, quando da questionável descoberta do Brasil em 1500.
Os Deuses Brilhosos são uma categoria de pessoas que se encontram, de certo modo, distante do mundo, dos mortais chamados “gente”. Essa categoria de Deuses existe desde que o mundo se tornou civilizado. Isso se deu em todas as áreas do conhecimento humano. Os Deuses Brilhosos não aceitam a caracterização em forma de oração adjetiva restritiva, ou seja, "Deuses que brilham", já que essa última forma encerra uma verdade inquestionável, conferindo aos Deuses a restrição verdadeira de serem dotados de luz, de destaque, de mérito.
Os verdadeiros Deuses Brilhosos não brilham, apenas se revestem de uma certa tinta que constrói a falsa impressão de que são dotados de um vigor luminoso que os destaca dos outros seres, como eles, também mortais. Isso mesmo: esses Deuses são mortais, porque são humanos e levam a vida a fazer isso ou aquilo para promoverem a imagem de seres invencíveis e acima de todos os outros.
Para eles, o tempo tem que ser gasto, ou melhor, empregado em algo que renda números, dados, matérias que promovam o seu brilho e a sua soberania dentre os meros mortais. Se você olhar bem para o seu lado, perceberá que não é necessário ir muito longe para encontrar um Deus Brilhoso. Ele se reveste das mais variadas funções em sociedade. O brilho do Deus não necessariamente é refletido no dinheiro que possui. Mas em qualquer coisa que represente o seu ego, que projete a sua pseuda importância para que as pessoas acreditem que aquele brilho é reflexo da grandiosidade que é guardada dentro de si.
Provavelmente, poucos são os Deuses Brilhosos que apresentam a grandeza de espírito condizente com a grandeza que o brilho projeta em sociedade. Infelizmente, para eles, o parecer-ser é mais importante do que o ser-por-ser. Ter, possuir, parecer, conservar, apossar-se são verbos que compõem o léxico dessas pessoas. Tudo que elas fazem é voltado para a projeção.
Ao que parece, ser Deus Brilhoso é uma forma de alavancar a baixa do ego. Como se algum tipo de repressão ou inibição fossem supridas pela “tinta brilhosa” e aquilo que ela representa. A vida desses Deuses, na maioríssima (desculpem esse horrível superlativo...) das vezes, é limitada a produzir status. Geralmente, são solteiros, e, sozinhos, dizem que o fato de estarem sem ninguém é uma questão de escolha. Mas, na verdade, são pessoas que administram mal a vida particular e não sabem lidar com a presença de outro ser, no mesmo patamar, na mesma intimidade, no mesmo espaço, ainda que esse espaço seja a cama.
Uma matéria de revista, uma nota de rodapé num artigo científico, um outdoor qualquer... tudo que servir para difundir a áurea dos Deuses Brilhosos é disputado a pau, a cacetete, a tiro por eles, porque não se admite que fulano ou sicrano sejam mais importantes no mundo perigoso e milimetricamente autoritário dos Brilhosos.
Se se fizesse uma entrevista, tipo jogo-rápido, rapidinha com algum Deus dessa natureza, seria mais ou menos assim:
1)Nome: (Desculpe entrevistador, prefiro que coloque o meu nome científico, como aparece nas minhas publicações...) PATAVINAS, B.
2) Idade: prefiro não dizer...
3) Hobby: Pode parecer bobagem, mas gosto de reler os meus artigos. Só para se ter uma ideia, publiquei até o final do ano passado, 300. Vê se pode? Estou no topo do rank.
4) Lugar predileto para passar as férias: Na verdade, são lugares, não gosto de repetir. As últimas foram fantásticas: Aspen. Gosto também de Paris, Grécia. Quando fico no Brasil, gosto de ficar num hotel simpleszinho, aquele que passou na novela das oito, da GLOBO. Bem simples...
5) Comida: Qualquer uma da culinária francesa.
6) Música: Já ouvia as de Mozart?
7) Sozinho(a) ou mal-acompanhado(a): Nunca fico sozinho(a). Mas prefiro ficar na minha própria companhia. Eu sei do que eu preciso...
8) Amigos: Essenciais, mas antes sem nenhum do que com algum que me traga transtornos.
(...)
Esses Deuses normalmente são pessoas mal resolvidas. Mas tem grana a dar com pau. Carro do ano. Férias nas Ilhas Gregas. Roupa da grife Armani. Passatempo predileto: cultivar o seu próprio ego.
Não podemos dizer que todos os Deuses Brilhosos são pessoas ruins, egoístas. Às vezes, fico até penalizado, pois não é fácil viver num mundo como o que nós temos, onde o indivíduo vale o que tem. E quem não tem, serve de coisa a quem possui o poder de mando. É fácil imaginar que a construção do homem em sua grande maioria se dá pelo modelo humano que é cultivado a cada época.
Vivemos hoje o momento da mercadorização do homem. Ser Deus Brilhoso é quase uma exigência para quem não tem pretensão de viver à luz falaciosa dos outros. Mas entre ser Brilhoso e ser humano, com dores e paixões que nos arrebatam, prefiro a segunda opção porque ostentação nenhuma vale o preço do sabor de um beijo, de um abraço aconhegante, de uma conversa comprida ao telefone, de uma reconciliação após uma briga por bobagem, de uma batata frita com amigos num barzinho qualquer... enfim, de viver sem o calor causticante que emanam do patamar de tais Deuses!
Um comentário:
Acaba de ganhar um leitor assíduo... Aguardarei mais atualizações para que possa desfrutar desses textos belíssimos!
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