quinta-feira, 25 de junho de 2009

Deus na Berlinda...

Fome. Guerras. Desastres naturais. Corrupção. Temas constantes em noticiários de televisão, manchetes de jornais e revistas, mídia on-line. Muitos são os debates, poucas as respostas e, consequentemente, nenhuma solução. Ao contrário, dia a dia, aumenta mais o conflito. Pessoas desesperadas. Governos atados. O Mundo, um caos. Cientistas das mais variadas áreas do conhecimento humano debruçam-se sobre o assunto em busca de explicaões, ao menos acalentadoras, mas nada muda, ou melhor, muda para a pior.
Está mais do que claro que desde que o mundo é mundo, que o homem é homem, que problemas sociais, ambientais, políticos existiram e sempre vão existir. É indiscutível que à medida que a sociedade humana adquire mais conhecimento, que torna-se mais detentora da capacidade de desvendar o mistério, mais o mundo enfrenta novos percalços e, em decorrência, o próprio homem sofre os efeitos, na maioria das vezes, nefastos, principalmente para aqueles que, pouco ou nada, contribuem para tal perturbação mundial.
Busca-se, assim, a raiz do caos. Por que tanta miséria? Por que tanta guerra? Por que tantos desastres? Essas e muitas outras perguntas preenhecm o vazio cortante. Instigam os curiosos. Inflamam as discussões. Muitas são as especulações, o que acaba dividindo a sociedade num antagonismo sem fim: de um lado, os crentes, os evangélicos, os católicos, e todos aqueles que creem que uma força superiora rege as ações humanas, seja agraciando com dádivas, por boas ações realizadas, com colheitas fartas, por exemplo; seja punindo, com catástrofes ambientais, como inundações, secas gritantes, queda de aviões, tudo isso como consequência dos maus hábitos, comportamento vergonhoso etc, etc, etc. Do outro, estão os cientistas, os racionais, os gnósticos, que defendem a tese de que tudo é advindo, exclusivamente, das ações humanas, despido de toda e qualquer interferência sobrenatural.

E, entre esse embate, estamos nós, mulheres e homens comuns, do povo, que labuta de domingo a domingo, para ganhar, quase sempre, um salário minguado, mediocre, um quase nada, a fim de satisfazer, minimamente, as nossas mais primárias necessidades.
Quando falo em "nós" refiro-me a uma maioria quase que sem contato com a informação, refiro-me, infelizmente, a um considerável parcela da humanidade que desconhece a própria essência do ser humano e o que lhe torna mais sublime dentre todos os seres existentes. O homem comum vive do que ouve, recebe toda a "informação" já peneirada pelos manipuladores do poder. O povo sabe aquilo que os idealizadores do poder querem que se saiba.

Difunde-se que é preciso crer em Deus, em Alá, em Ogum em Fulano ou em Sicrano. Justifica-se isso, conforme os estudos da Psicanálise Freudiana, porque o homem necessita de um consolo espiritual. Que o homem que crê vive mais e melhor, já que o humano é feito para crer em algo. E assim o homem vai crendo que Deus dá presente quando fazemos coisas boas. E nos pune quando somos "mal-criados", como um pai que castiga o filho traquino quando este apronta uma de suas peripécias. E assim o conformismo espiritual vai consumindo o conformismo social.

Os céticos, que compartilham do ideal do "ver para crer", rebatem, categoricamente, quando questionam a existência de Deus. Para eles, Deus é apenas uma invenção humana, criado para satisfazer a necessidade de se ter resposta para tudo. Tudo, inclusive para a podridão que se espalha desde que o mundo é mundo. Contra-argumentam, justificando que "Que 'Deus' é esse que permite tanta miséria, tanta criança esquelética, tantos desastres naturais, tanta maldade no olhar humano?" É um ponto interessante a ser debatido, mas que, certamente, para o qual não se encontrará um consenso plausível.
A Ciência é tida como a Deusa da Modernidade. Foi, sem sombra de dúvidas, a forma mais cômoda que o homem medieval encontrou para fugir das amarras da ignorância defendida e difundida pelo pensamento religioso daquela Era. Deus era (e é, infelizmente) um joguete, um marionete, um brinquedo, enfim, uma arma nas mãos daqueles que detinham, à época, o poder de fazer prevalecer a ideologia que lhes era dominante. Deus era o Pai Eterno e Misericordioso, quando podia presentar os que realizassem "doações" para aumentar o patrimônio do Genitor Celestial. Em contrapartida, Deus era o Carrasco, que subjugava aqueles que desobedeciam os Seus Mandamentos, que se recusavam a "comprar" um terreno no céu ou que, por cederem aos prazeres da carne, tinham seus nomes riscados do Livro da Vida.

Esta visão errônea que se tinha sobre Deus foi alterada quando se consolidou o surgimento do verdadeiro pensamento científico. Neste momento de mudança de foco, Deus deixou de protagonizar o espetáculo e a ciência passou a guiar a trajetória humana. O Iluminismo marca, deste modo, exatamente essa transposição. A concepção medieval sendo substituída pela liberdade que a Revolução Industrial estava proporcionando ao novo homem que despontava.

A partir daí, a relação entre o divino e o terreno passou por um novo processo adaptação social. As ciências humanas ganharam novo espaço. A Sociologia e Antropologia, orientadas por um forte cunho filosófico, passaram a explorar o homem em todas as suas dimensões e percebeu-se que ele era dotado de duas formações: uma biológica, reflexo direto da própria evolução, conforme apregoa a Teoria da Seleção das Espécies de Darwin; e outra cultural, como forma de compensações de suas próprias limitações físicas.

Com o tempo, o homem foi percebendo que o seu poder criador atendia às suas necessidades mais básicas e, de certa forma, a sua dependência de Deus foi se tornando mais tênue. Vale salientar que esse "afastamento" da entidade divina deu-se, principalmente, nos grupos elitizados, uma vez que o homem comum e economicamente desfavorecido continuava crendo nas dádivas e castigos divinos. O próprio conhecimento humano passou a ser dividido em níveis, de forma que o conhecimento do homem comum é visto pelo meio acadêmico-intelectual como superficial, oriundo das crenças populares, intimamente ligado aos preceitos religiosos. Enquanto que a cultura predominante virou sinônimo de ciência e incontestabilidade.

Hoje, assistimos a um embate forte entre essas duas formas de encarar a realidade. O Brasil é um país religioso em sua essência. Relembremos, pois, a sua construção espiritual, com os índios, portugueses, os negros. Notemos, por outro lado, a influência da ciência no dia-a-dia do homem. Em tudo há a técnica, o método, o experimento, a observação, como reflexo daquilo que somos capazes de criar, de desenvolver, de aperfeiçoar. Vivemos, paradoxalmente, na Era da Dúvida e da Certeza. A matéria e o espírito disputando a atenção do homem no que concerne à contemplação e, em decorrência, a própria explicação da realidade. Os materialistas mantém a firme defesa do predomínio da ciência. Esta como início e fim do que constrói o homem.

Os céticos criticam a crença em um deus ou em vários. Usam como argumento o princípio silogístico de que se Deus é misericordioso e poderoso, por qual motivo Ele não acaba com toda a miséria que assola o mundo num passe de mágica? Onde se encontra a sua eterna bondade se o que mais vemos são inocentes pagando com a própria vida pela ganância de tantos pecadores? Por que prolongar mais o tempo para a redenção dos fracos? Essas e muitas outras dúvidas são discutidas. A Filosofia tenta encontrar caminhos possíveis para se chegar a um denominador comum. Mas, com ela, surguem mais e mais questionamentos.

Os crédulos mais ferrenhos na fé divina encontram acalento no princípio de que Deus pune pelos males que cometemos. E que se tivermos uma conduta santa seremos agraciados com os sabores que poderão advir dos céus...

Percebemos que desde que surgiu na Terra, atravessando os séculos, evoluindo, abandonando o estado de natureza, apossando-se da racionalidade, o homem tem buscando respostas para os seus conflitos. A sua sede pelo crescimento, pelo ter mais, pelo ser mais, muitas vezes, impede-o de notar que a matéria por si só não possui poder algum. Faz-se mister que nós, seres dotados de relativa inteligência, concebamos a magnitude do estar no mundo não como obra do acaso, de uma explosão desmedida e desmotivada. Somos frutos de uma Força Maior, Inteligente, Superior. É preferível que a ela não seja dada nenhuma denominação como querem os cristãos, os mulçumanos, os umbandistas, os gnósticos. Uma nomeclatura limitaria bastante a própria ideia que se tem acerca da supremacia do cosmo em consonância com as reduzidas formas de se entender o desconhecido por parte do homem.

É aconselhável que não se julge Deus como sendo o causador de todas as mazelas que o homem cria, desenvolve, fomenta. Ao longo de sua história sobre a Terra, o bicho-homem tem conseguido demonstrar que tem o poder. E que esse poder não é fruto do acaso. Ele é exatamente o reflexo do presente que nos foi dado. A ciência é este poder! Temos a capacidade de criar e descobrir novas formas de vivermos bem. Creio, plenamente, no livre-arbítrio. Somos detentores do poder de escolha. De buscarmos o melhor e exotarmos o pior. A escolha é nossa. Foi nos dado esse privilégio de percebermos que estamos vivos e que, como já preconizava Descartes, "logo existimos". O homem constrói e o homem destrói. Faz nascer e faz morrer. A escolha é sempre nossa. Deus... bom Deus foi o Arquiteto do Universo. Nós, homens com escolha, os mestres de obra de nossas próprias ações. Tiremos Deus da Berlinda. E coloquemo-nos nós próprios em Seu lugar. A escolha é nossa. Julgemo-nos e mudemos nossa trajetória terrestre, para quem sabe, um dia nos tornamos o mais próximo possível de Deus: Luz e Bondade para os homens (todos!) de Boa Fé! Amém!

Nenhum comentário: